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Estratégias de atenção às violações de direitos de crianças e adolescentes durante o confinamento

  • drdivinopolis
  • 13 de mai. de 2020
  • 5 min de leitura

Suspensão do período letivo e confinamento como medida de contenção ao Covid-19, essa nova realidade que afetou a rotina de muitas famílias brasileiras pode promover o aumento de casos de violação de direitos, como já foi constatado em outras epidemias. De acordo com reportagem da UNICEF, durante o surto de ebola ocorrido entre 2014 a 2016 na África Ocidental, houve aumento significativo “de trabalho infantil, negligência, abuso sexual e gravidez na adolescência. Em Serra Leoa, os casos de gravidez na adolescência chegaram a 14 mil, mais do que o dobro de antes do surto.” (UNICEF, 2020). Considerando estes pressupostos, como devemos agir para não tornar a violação de direitos de crianças e adolescentes também uma “epidemia”?


Primeiramente devemos entender quem são os agentes responsáveis por estas ações de garantia de direitos. Há no Estatuto da Criança e Adolescente – ECA (Lei Federal 8.069/90), dois artigos que nos trazem esta informação: o art.4º e 86. No art. 4º temos o seguinte:


É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária. (BRASIL, 1990)

Não por acaso o legislador ao enumerar os responsáveis pela garantia de direito destas crianças e adolescentes colocou a família em primeiro lugar, devido à sua proximidade no cuidado à estes indivíduos. Porém, previu também que nem sempre as famílias terão condições de prover todo o necessário, por isso colocou como de corresponsabilidade da sociedade e do poder público prover esses direitos.

E com relação ao poder público? À quem cabe essa atribuição? Essas respostas nos são dadas através do art.86 desta mesma normativa, em que temos: “A política de atendimento dos direitos da criança e do adolescente far-se-á através de um conjunto articulado de ações governamentais e não-governamentais, da União, dos estados, do Distrito Federal e dos municípios. (BRASIL, 1990 Grifo nosso.) Ou seja, o texto nos sugere que há mais de um responsável pelo provimento destas garantias, afinal são muitos os direitos enumerados pelo ECA ao longo do Título “Dos direitos fundamentais”.

Mas o que esses diversos atores (governamentais e representantes da sociedade) podem fazer para prevenir o aumento dos casos de violação de direitos? Há duas vertentes de atuação que precisamos pensar:




Nos concentramos na atenção às violações, trazendo as principais orientações já promulgadas:


1.“Promover a divulgação dos canais de denúncia” (item, 8.a Recomendações CONANDA, 2020)


  • É importante utilizar de diversos meios para a divulgação dos canais de denúncia: carro de som, propagandas na rádio, notas em jornais, posts nas redes sociais, cartazes de fácil visualização à longa distância nos postos de atendimento (na sede do Conselho Tutelar, da polícia, nos postos de saúde...)

  • O Conselho Tutelar, de acordo com as orientações já emitidas poderá funcionar em regime de plantão, desde que possua estrutura física adequada para o desempenho da função, caso contrário o município poderá optar pelo atendimento em sede com revezamento dos Conselheiros, a fim de evitar contato próximo. Em ambos os casos é primordial que a população seja informada do regime de funcionamento. Ressaltamos ainda que em hipótese alguma o serviço poderá ser interrompido (conforme consta no art.131 da Lei Federal nº8.069/90)


2.“Facilitar o contato das crianças com a rede de proteção para pedido de ajuda” (item, 8.d Recomendações CONANDA, 2020)


  • Sugerimos a diversificação dos canais de denúncia (telefone, email, SMS, whatsapp...) para maior segurança aos denunciantes e facilidade de criação de estratégias.

  • As recomendações do CONANDA sugerem que os profissionais de saúde fiquem atentos aos possíveis sinais de violência destas crianças e realizem denúncias em caso de suspeita reais.


3.“Dar atenção especial às famílias com histórico de violência contra crianças, crianças em situação de rua, e crianças em casas com cuidadores/familiares usuários de álcool e outras drogas (...)” (item, 8.b Recomendações CONANDA, 2020)


  • Promover o acompanhamento dos casos de risco é uma forma de facilitar as denúncias. A proximidade dos profissionais com a família pode promover confiança para o relato das violações

  • O CREAS, mas também o CRAS, podem realizar o levantamento da ficha dos acompanhamentos para entrar em contato com as famílias em maior risco de violação de direitos (seja por whatsapp, SMS, ou telefonema) e esclarecer sobre a disponibilidade dos serviços

4. Promover uma reunião com responsáveis pelas políticas que compõe o Sistema de Garantia de Direitos do município para acordar “procedimentos padrão para documentação e encaminhamento de casos que possam precisar de acompanhamento” (item 2.1 da Nota técnica da UNICEF, 2020)


  • Importante acordar responsáveis para cada setor que participar do fluxo de encaminhamento e partilhar as formas de contato com esses responsáveis para além dos instrumentos formais. Devido ao regime de alternância de equipes que muitos equipamentos têm adotado é fundamental estabelecer formas de contato remoto eficaz, a fim de garantir o sucesso dos encaminhamentos

  • A documentação destes procedimentos padrão que serão adotados ajuda a equipe a saber as normas de procedência mesmo no caso da ausência de qualquer coordenador ou trabalhador que não tenha sido envolvido na discussão.



5. Discutir “protocolos claros para prevenir/reduzir a separação familiar e outras formas de risco para a proteção de crianças;” (item 2.1 da Nota técnica da UNICEF, 2020)


  • Ressaltamos que a discussão desses protocolos seja realizada junto ao judiciário, que é quem possui autoridade para este tipo de decisão, embora em casos muito excepcionais o Conselho possa providenciar a institucionalização de crianças e adolescentes quando da ocorrência de flagrante de violência ou abuso sexual, conforme posto no art.101, §2, da Lei Federal 8.069/90.

  • Lembrando que o art.130 da Lei Federal 8.069/90 estabelece que preferencialmente deve-se realizar o afastamento do agressor do domicílio em detrimento da criança e do adolescente

  • Caso o município não possua instituição de acolhimento para crianças e adolescentes é ainda mais importante o estabelecimento dos procedimentos a serem adotados.

Embora o cenário atual nos convide à reclusão, ressaltamos a importância da discussão conjunta das estratégias de atenção às violações aqui enumeradas através aplicativos de videoconferência. Ressaltamos que o sucesso das ações planejadas depende do engajamento dos atores e adequação das estratégias à realidade local, por isso o município deve levar em consideração sua autonomia para legislar seu próprio plano de ação.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:


ALIANÇA PARA A PROTEÇÃO DA CRIANÇA EM AÇÕES HUMANITÁRIAS. Nota Técnica: Proteção da Criança durante a Pandemia do Coronavírus , Versão 1, Março de 2020. Disponível em: <https://www.unicef.org/brazil/media/7561/file> Acesso em: abr. 2020.

BRASIL, Lei federal 8.069, de 13 de julho de 1990. Dispõe sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8069.htm>. Acesso em: abr. 2020.

CONSELHO NACIONAL DOS DIREITOS DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE. Recomendações do CONANDA para a proteção integral à crianças e adolescentes durante a pandemia COVID-19. Março de 2020. Disponível em: <http://www.crianca.mppr.mp.br/arquivos/File/legis/covid19/recomendacoes_conanda_covid19_25032020.pdf>. Acesso em: abr. 2020.

FÓRUM COLEGIADO NACIONAL DE CONSELHEIROS TUTELARES. Recomendação 01/2020. Dispõe sobre a Recomendação aos Gestores Municipais dos 5.570 municípios e do Governador do Distrito Federal, que assegurem aos Conselhos Tutelares condições necessárias para o atendimento a população, salvaguardando a integridade, a saúde e a vida dos Conselheiros Tutelares do Brasil, e dá outras providências. Março de 2020. Disponível em: <http://www.crianca.mppr.mp.br/arquivos/File/legis/covid19/recomendacao_fcnct_n01_2020_covid19_18032020.pdf> Acesso em: abr. 2020.

MINISTÉRIO DA MULHER, DA FAMÍLIA E DOS DIREITOS HUMANOS. Carta de orientações. Brasília, março de 2020. Disponível em: <https://www.cnm.org.br/cms/images/stories/comunicacao_novo/links/Orienta%C3%A7%C3%B5es_SNDCA_CNM-CT.pdf> Acesso em: abr. 2020.


 
 
 

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