7 Dicas para Trabalhar com Adolescentes em Cumprimento de Medidas Socioeducativas
- drdivinopolis
- 10 de set. de 2019
- 5 min de leitura
Eveline Pardini Chaves
Analista de Gestão e Políticas Públicas em Desenvolvimento da SEDESE com formação em Serviço Social
Este post é pra você, que encontra dificuldades na adesão dos adolescentes em cumprimento de Medidas Socioeducativas (LA ou PSC) nos serviços da Assistência Social. De fato não existe “receita de bolo” quando trabalhamos com adolescentes, mas isso não impede que usemos a nossa criatividade para construir propostas de trabalho mais atrativas e condizentes com os valores e diretrizes da política de Assistência Social.
De acordo com a Tipificação Nacional dos Serviços Socioassistenciais (TNSS - Resolução Nº 109, de 11 de novembro de 2009), o Serviço de Proteção Social a Adolescentes em Cumprimento de Medidas Socioeducativas de Liberdade Assistida (LA), e de Prestação de Serviços à Comunidade (PSC) tem os seguintes objetivos:
Realizar acompanhamento social a adolescentes durante o cumprimento de medida socioeducativa de Liberdade Assistida e de Prestação de Serviços à Comunidade e sua inserção em outros serviços e programas socioassistenciais e de políticas públicas setoriais;
Criar condições para a construção/reconstrução de projetos de vida que visem à ruptura com a prática de ato infracional;
Estabelecer contratos com o adolescente a partir das possibilidades e limites do trabalho a ser desenvolvido e normas que regulem o período de cumprimento da medida socioeducativa;
Contribuir para o estabelecimento da autoconfiança e a capacidade de reflexão sobre as possibilidades de construção de autonomias;
Possibilitar acessos e oportunidades para a ampliação do universo informacional e cultural e o desenvolvimento de habilidades e competências;
Fortalecer a convivência familiar e comunitária.
Os objetivos mencionados acima nos convoca a assumir um papel de educadores, para além da verificação do cumprimento legal de uma sentença. Exercer esse papel não é algo fácil, pois a socioeducação requer de nós a capacidade de questionar nossas próprias crenças, saberes e atitudes.
Estamos dispostos a abandonar nossas práticas “engessadas” para construir propostas de trabalho mais atrativas para esses adolescentes, sem perder de vista os objetivos do Sistema Único de Assistência Social (SUAS)? Se você topou o desafio, algumas dicas poderão ajudar nesse percurso:
1.Deixe seu preconceito em casa – Se você não enxerga perspectivas de futuro para esses adolescentes, sente repulsa quando pronunciam algum tipo de gíria e torce para que a redução da maioridade penal seja implementada no país, repense seu lugar na Assistência Social. A construção de novos projetos de vida só será possível se houver a adesão dessas e desses adolescentes nos nossos serviços. E isso só acontece quando estabelecemos com o outro uma relação de reciprocidade, confiança e vínculo. Como vou conseguir a adesão se não demonstro nenhum desejo em estabelecer contato com essas e esses jovens?
2.Não confunda “responsabilização” com “punição” – Discursos moralistas e práticas punitivas não promovem socioeducação. Pelo contrário, podem provocar afastamento e evasão dos serviços. O papel do SUAS para com os adolescentes em cumprimento de medidas socioeducativas é propiciar a responsabilização sobre o ato infracional cometido (através de espaços que possibilitem reflexões sobre o exercício consciente de escolhas, convivência em sociedade, direitos e obrigações, etc.) e promover a proteção social dessas famílias como um todo, por meio da inclusão nos serviços socioassistenciais e do acesso aos direitos civis e sociais.
3.Procure conhecer o universo desses adolescentes – Durante os atendimentos, busque conhecer os interesses musicais, artísticos e profissionais desses adolescentes. Fique atento à linguagem, formas de expressão, hobbies e habilidades. Outra dica é pesquisar quem são as referências dessas e desses adolescentes para além da família (em quem se inspiram, quem são seus ídolos, quais grupos sociais se identificam). A identificação dessas características é importante para favorecer o diálogo e pensar atividades que sejam atrativas para esse público (sem esquecer-se dos objetivos do SUAS, é claro)! Neste link você encontra algumas músicas que poderão ser utilizadas no trabalho com os adolescentes e suas famílias, de acordo com o tema abordado: https://psicologianosuas.com/2013/10/08/60-musicas-para-dinamicas-de-grupos/
4.Não se esqueça da Família – São comuns os relatos frustrados de acompanhamento isolado desses adolescentes, descolado do contexto familiar em que vivem. Não se esqueça que o núcleo familiar, independentemente do arranjo em que se apresenta, constitui importante referência para todos nós (na transmissão valores, nas relações de afeto e cuidado), o que não significa que essa mesma família esteja isenta de situações de desproteção. Por vezes, o ato infracional pode estar associado à vivência de situações de pobreza e até mesmo violação de direitos. Inserir a família no acompanhamento junto ao adolescente, propiciar espaços de trocas de experiências com outras famílias e promover o acesso aos direitos é um ponto importante nesse percurso.
5.“Construa junto” ao invés de “construir para” – Precisamos romper com a ideia de que somente nós sabemos o que é melhor para os usuários do SUAS. Ao contrário do que se pensa, a corresponsabilização das pessoas pelo seu processo é maior quando elas participam da construção das alternativas. Ao invés de elaborar o Plano de Acompanhamento para o(a) adolescente, que tal construí-lo em conjunto com ele(a) e sua família? No Prontuário SUAS você encontra uma seção específica para a construção do Plano de Acompanhamento familiar, veja só: http://blog.mds.gov.br/redesuas/wp-content/uploads/2019/04/Prontu%C3%A1rio-SUAS_SemLogo.pdf
6.Transite entre o individual e o coletivo – Para além dos atendimentos individuais, o SUAS nos convida a desenvolver ações coletivas. E, neste caso, pode ser organizada com a ajuda e protagonismo dos próprios adolescentes. Embora pouco exploradas, as oficinas podem contribuir de forma significativa no trabalho com esses adolescentes, pois estimulam a socialização, possibilitam a reflexão de questões comuns ao grupo (como o exercício de escolhas, as diferentes formas de lidar com as situações vivenciadas, regras de convivência em sociedade, etc.) e a troca de experiências. É na relação com o outro que nós, seres humanos, formamos nossas opiniões, questionamos algumas crenças, encontramos alternativas para problemas comuns para, a partir daí construirmos o nosso próprio projeto de vida. O trabalho com grupos não segue uma “receita de bolo”, mas o artigo abaixo nos mostra que é uma ação exequível e possível: http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1809-89082016000200010
7.Busque parcerias – A reconstrução de projetos de vida perpassa o acesso a oportunidades (de profissionalização, de educação, de desenvolvimento de habilidades, etc.). Isso requer de nós o esforço de sair da “caixinha” da Assistência Social e buscar parcerias com universidades, OSC’s, Sistema S (SESI, SENAIS, SENAR, etc.), e empresas inscritas no Programa Jovem Aprendiz. O artigo abaixo mostra a parceria celebrada com a Universidade Federal do Rio Grande do Sul, que culminou numa oficina de fotografia com os adolescentes em cumprimento de Medidas Socioeducativas: https://craspsicologia.files.wordpress.com/2012/10/oficina-socioeducativa-com-adolescentes-em-medidas-socioeducativas.pdf
Espero que tenham gostado das dicas! Vou me despedindo com um pensamento de Paulo Freire que diz: “Ninguém nasce educador ou marcado para ser educador. A gente se faz educador, a gente se forma, como educador, permanentemente, na prática e na reflexão da prática”.
Referências para leitura:
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